As impossíveis, apetitosas peras
As peras da fruteira não têm a sua cor natural: nunca vi (senão aqui) formas de fruta pera com tanta cor de pêssego maduro madurinho, de pelo raso a estalar de sumo!
A criança que uma colheu, não come. Sente primeiro o sabor com as mãos, cheirá-la-á depois e, antes da estreante dentada forte, há-de pesá-la, atirando-a de uma palma à outra da mão.
Conhecem muito melhor os frutos, as crianças - não questionam a bizarra e invulgar cor: sentem-nos e pronto, sabem o que é!
Algo a distrai do lado de fora do quadro : terá a mãe chamado? Terá o gato entrado? Terá o vento assobiado?
Ignaros nós, que a vemos, e nunca saberemos por que razão se distraiu ela da sua pera nem tão pouco por que razão sabem elas tanto a pêssego maduro madurinho ao pintor que as recriou com cores tais.
Ignaros nós, que vemos pêssegos de uma só específica cor e peras na sua específica forma.
Ah, menina, que vontade de ser parte desse mundo que habitas, ser linha ou cor (tanto faz) e causar espanto por ser ao contrário ou diferente do suposto!
Ah, menina, que vontade de ser a causa da tua distracção, de te conhecer e de contigo lanchar as impossíveis peras que casualmente seguras entre mãos!