Amue Cocozette
Uma receita é, na sua essência, muito similar a um formulário de medicamentos.
Em ambos os casos, vários ingredientes se misturam meticulosamente até chegar a um resultado, uma coisa outra, resultante de interacções várias : um pão que fermentou, um alprazolan que se embalou!
Um amuo é, na sua essência, o pão e o alprazolan!
É o amuo aquele estado d'alma irreverente, impertinente e magoado que impede o trato interpessoal: fermenta como o pão, embala-se para não estoirar.
Contagiante, alastra-se pelos presentes como lepra! Como serpente, subrepticiamente prende e ata, enroscando a garganta da vítima que falar não deve, mexer não pode e a fugir não se atreve.
Como água, ensopa mesmo que se não queira, como sol, desidrata até mirrar!
É o amuo um momento de desprotecção, de sensibilidade ferida, de humanidade sensível e sensitiva, avessa à razão e ao puxão, contrária à partilha... denunciadora de uma chaga!
É o amuo uma crise e um desgosto passageiro: o direito de se não ser razoável nem racional, a obrigação de não se conseguir compactuar nem aceitar tudo!
"Amuada, Laura fechou-se no seu quarto de menina. Não queria ver ninguém! Não queria que lhe falassem, que lhe dissessem, que a fizessem compreender fosse o que fosse. Entregue a si própria, remoía o castigo que a mãe lhe impusera :"Agora, Laura, vais buscar a camisola de lã verde de gola alta, as calças castanhas e as botas que a avó deu! É isso que vais vestir hoje, e já te disse!"
No seu quarto, Laura não queria ver ninguém! Numa veneta, vestiu o seu vestido preferido, apertado, gasto e às risquinhas, calçou as sandálias que tinham o lacinho dos seus sonhos, pôs o colar de pérolas falsas ao pescoço, pintou a boca de vermelho escarlate, saíu do quarto e, amuada, respondeu: "Não vou!"
(*ao meu Sonjo)
1 comentário:
*
Enviar um comentário